quarta-feira, 16 de julho de 2008

anti anti



O mundial de futebol antiracista, no qual participei, teve lugar estes últimos dias em Casalecchio di Reno, uma localidade muito perto de Bolonha. Tudo corria muito bem tanto a nìvel organizativo como desportivo (inclusivé a minha equipa de amigos austríacos e italianos classificou-se em primeiro lugar do seu grupo com cinco vitorias em cinco partidas). Ambiente de festa, com concertos e noites longas, fossem por vontade própria ou por imposição alheia daqueles que, nao querendo dormir, também nao deixavam que os outros o fizessem.
A festa, no entanto, acabou abruptamente no sábado ao inìcio da tarde, com a chegada de notìcias relativas a abusos de indole sexual a algumas raparigas. A organização deu por encerrado o torneio e, depois de uma assembleia extraordinária, declarou as equipas exclusivamente compostas por mulheres as vencedoras do torneio…
O discurso desta assembleia fez-me pensar: o tom geral era de condenação, quase de consternaçao; e as decisoes (cancelamento do torneio, entrega do troféu às equipas femininas), todas elas no mínimo discutíveis, se enquadradas pela absoluta falta de prova, ou mesmo de indícios, de que tais abusos realmente ocorreram. Mas o que me interessa aqui é apenas a relação estabelecida, naquele momento, entre o contexto e a palavra, isto è, o nexo simbiotico entre o evento e as suas directrizes ideológicas (de facto a maioria dos participantes milita em claques de futebol organizadas e orientadas politicamente) e a denúncia de actos que comportam uma reacção imediata e exagerada dos orgãos de decisão ali instalados. O que me pareceu, sublinhando sempre que actos de violência real sao absolutamente condenáveis e graves, foi que o discurso (a denúncia) encontrou o ambiente perfeito para ser empolada, elevando o tom emocional e conduzindo a uma espiral de consequências e conclusões que ignoram regras básicas de criticismo, frieza e racionalidade.
Nao me espanta por aí além que no fim da assembleia quase me sentisse culpado de ser homem e de experimentar prazer em ver mulheres bonitas. O tom geral de condenação era tao grande que ninguém mais parecia ter em conta os aspectos basicos da “natureza” dos géneros, como se o “galar uma gaja” fosse uma deturpação horrìvel da sociedade ultra-capitalista, fascista e machista onde vivemos. Ou seja, o que faltou por ali foi o bom senso de reconhecer que existe uma atraçao inter-sexus, e isso leva inevitavelmente à tentativa de aproximaçao entre individuos machos e individuos femeas. Depois, é preciso ter consciência, especialmente da parte dos machos, que nem tudo se pode fazer, que nem tudo vale, e que quando a femea diz não de forma peremptoria normalmente isso quer dizer mesmo não.
O que faltou naquelas denúncias que foram ali expostas foi credibilidade. As senhoras declaravam-se feministas, e a possibilidade de acusar o género oposto naquele contexto era para elas mel. Nao ponho as mãos no fogo para jurar que nao terão sido verdadeiramente molestadas (de qualquer forma nao houve, por exemplo, relações sexuais nao consentidas, nao houve polícia envolvida, nao houve nada disso) mas penso que este nexo palavra-ambiente pode muito bem explicar a descriminação positiva que ali teve lugar, com consequências não verdadeiramente sérias ou graves, mas proporcionais ao alcance daquela manifestaçao (a taça foi para as senhoras, como jà disse). Ē claro, este acontecimento enquadrado naquele micro-ambiente torna mais acessivel e fácil de interpretar o que se passa na sociedade inteira, quando se ampliam o eixo discurso-contexto e as suas consequências. O feminismo, o antiracismo, e em geral os movimentos de antidescriminaçao jogam o seu papel numa dialética necessária que estabelece a própria legitimidade do poder que de facto descrimina. Para haver uma acção legitimada e inscrita deve de haver uma reacção contrária que acentue e traga à luz o que há dentro do poder para ser “combatido”.